É possível receber auxílio-acidente e continuar trabalhando!
- Vanessa Miranda
- 30 de jul.
- 5 min de leitura
Você sabia que é possível receber o auxílio-acidente e continuar trabalhando normalmente? Esse é um dos benefícios previdenciários mais mal compreendidos pelos trabalhadores brasileiros. Muitas pessoas acreditam erroneamente que precisam parar de trabalhar para ter direito ao benefício, ou que recebê-lo impede a continuidade das atividades profissionais. A realidade é bem diferente.
O auxílio-acidente foi criado justamente para garantir suporte financeiro extra aos trabalhadores que, mesmo com limitações decorrentes de acidentes, mantêm sua capacidade de trabalhar. Trata-se de um direito garantido por lei que pode representar uma importante complementação de renda por toda a vida laboral do segurado.
O que é o auxílio-acidente?
O auxílio-acidente é um benefício previdenciário de caráter indenizatório pago pelo INSS ao trabalhador que sofreu um acidente e ficou com sequelas permanentes que reduzem sua capacidade laboral, mesmo que parcialmente. Regulamentado pela Lei 8.213/91, especificamente no artigo 86, esse benefício reconhece que determinadas lesões, embora não impeçam completamente o trabalho, geram limitações que merecem compensação financeira.
Diferente de outros benefícios previdenciários como o auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez, o auxílio-acidente não substitui o salário. É um valor adicional que o segurado recebe mensalmente como forma de reparação pelas limitações adquiridas. O Decreto 3.048/99 esclarece que o benefício tem natureza compensatória, destinado a reparar a redução da capacidade laborativa decorrente do acidente.
A característica indenizatória é fundamental: o benefício visa compensar a perda de capacidade, não substituir a renda do trabalho. Por isso, é perfeitamente compatível com o exercício de atividade remunerada, seja na mesma função (quando possível) ou em atividade adaptada às novas condições do trabalhador.
Quem tem direito ao auxílio-acidente?
O benefício é destinado aos segurados do INSS que preencham cumulativamente os seguintes requisitos estabelecidos em lei: tenham sofrido acidente de qualquer natureza (trabalho, trânsito, doméstico, esportivo ou qualquer outra situação), apresentem sequelas permanentes que comprovadamente reduzam sua capacidade para o trabalho habitual, tenham a redução de capacidade constatada através de perícia médica oficial do INSS e mantenham a qualidade de segurado no momento do requerimento.
É importante esclarecer que o tipo de acidente não interfere no direito ao benefício. Tanto acidentes de trabalho quanto acidentes comuns (fora do ambiente laboral) podem gerar direito ao auxílio-acidente, desde que resultem em sequelas permanentes. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça já consolidou esse entendimento, reconhecendo que a origem do acidente não é fator determinante para a concessão do benefício.
Quanto aos segurados com direito, a legislação é específica: trabalhadores com carteira assinada (empregados urbanos e rurais), trabalhadores avulsos, segurados especiais (trabalhadores rurais em regime de economia familiar) e alguns contribuintes individuais que tenham sofrido acidente de trabalho. Aposentados, pensionistas e servidores públicos estatutários não fazem jus ao benefício, conforme estabelece o parágrafo único do artigo 86 da Lei 8.213/91.
Compatibilidade com o trabalho:
Sim, é perfeitamente possível e legal continuar trabalhando enquanto recebe o auxílio-acidente. Essa compatibilidade está expressamente prevista na legislação previdenciária e representa uma das principais características que diferencia esse benefício dos demais. O artigo 86, § 2º da Lei 8.213/91 é claro ao estabelecer que o auxílio-acidente será devido até a véspera do início de qualquer aposentadoria ou até a data do óbito do segurado.
A ratio legis (razão da lei) é simples: como o benefício tem caráter indenizatório e não substitutivo de renda, o segurado pode e deve continuar suas atividades laborais sempre que possível. O objetivo é compensar a redução de capacidade, não criar dependência previdenciária. Muitos beneficiários, inclusive, são readaptados em suas funções ou migram para atividades compatíveis com suas novas limitações, mantendo vida laboral ativa.
O Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) reconhece essa compatibilidade em suas instruções normativas. A IN INSS/PRES nº 77/2015 estabelece que o exercício de atividade remunerada não é impeditivo para a manutenção do auxílio-acidente, reforçando o caráter indenizatório do benefício. Trabalhar não apenas é permitido como é encorajado, desde que respeitadas as limitações decorrentes das sequelas.
Valor e duração do benefício:
O valor do auxílio-acidente corresponde a 50% do salário de benefício, conforme estipula o artigo 86, § 1º da Lei 8.213/91. O salário de benefício é calculado com base na média aritmética simples dos maiores salários de contribuição correspondentes a 80% de todo o período contributivo, descartando-se os 20% menores valores. Esse cálculo segue as mesmas regras aplicadas a outros benefícios previdenciários.
Para segurados que contribuíram antes de julho de 1994, o cálculo pode incluir salários corrigidos monetariamente conforme os índices oficiais. É importante notar que o valor mínimo do auxílio-acidente não pode ser inferior ao estabelecido em lei para essa modalidade de benefício, mesmo que 50% do salário de benefício resulte em quantia menor.
O benefício é reajustado anualmente pelos mesmos índices aplicados aos demais benefícios do INSS, garantindo a manutenção do poder aquisitivo. O pagamento é vitalício, cessando apenas nas seguintes hipóteses: início de qualquer modalidade de aposentadoria, morte do segurado, recuperação total da capacidade laborativa (constatada em perícia médica) ou perda da qualidade de segurado quando não há atividade remunerada.
Como solicitar o benefício?
A solicitação deve ser feita diretamente no INSS através dos canais oficiais: site meu.inss.gov.br, aplicativo "Meu INSS" para dispositivos móveis ou pelo telefone 135. O requerimento pode ser feito a qualquer tempo após a consolidação das sequelas, não havendo prazo decadencial para a solicitação, conforme jurisprudência consolidada do STJ.
A documentação necessária inclui documento de identidade oficial com foto, CPF, Carteira de Trabalho (física ou digital), comprovante de residência atualizado, relatórios médicos detalhados descrevendo as sequelas e sua permanência, exames complementares que comprovem as limitações (radiografias, ressonâncias, tomografias, etc.), laudos de especialistas na área específica da lesão e, quando se tratar de acidente de trabalho, a Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT) emitida pela empresa.
O passo mais importante é a perícia médica do INSS, onde um médico perito avaliará se há efetivamente redução permanente da capacidade laborativa. É recomendável levar todos os documentos médicos organizados cronologicamente e, se possível, um relatório médico atualizado que descreva claramente as limitações funcionais decorrentes do acidente. A perícia pode ser agendada online ou será automaticamente marcada após a análise inicial do processo.
Aspectos jurídicos importantes:
A jurisprudência dos tribunais superiores é pacífica quanto ao direito ao auxílio-acidente para segurados com sequelas permanentes que reduzam a capacidade laborativa. O Superior Tribunal de Justiça, através da Súmula 456, estabeleceu que "a decisão que concede benefício por acidente de trabalho ou auxílio-acidente presume a incapacidade na data do requerimento administrativo, ainda que a perícia médica tenha sido realizada em data posterior".
Importante destacar que a Emenda Constitucional nº 103/2019 (Reforma da Previdência) não alterou as regras do auxílio-acidente, mantendo sua natureza indenizatória e compatibilidade com o trabalho. O benefício continua sendo devido aos segurados que preencham os requisitos legais, independentemente das mudanças promovidas na reforma.
Em casos de indeferimento pelo INSS, é possível recorrer administrativamente no prazo de 30 dias ou ingressar com ação judicial na Justiça Federal. A jurisprudência tem sido favorável aos segurados em casos onde há comprovação médica adequada das sequelas permanentes, especialmente quando há divergência entre a avaliação do perito do INSS e os documentos médicos apresentados.
O auxílio-acidente pode ser cumulado com outros benefícios previdenciários? A regra geral é que não há cumulação, exceto com pensão por morte. Segurados que já recebem aposentadoria não fazem jus ao auxílio-acidente, pois o benefício cessa na véspera do início da aposentadoria. Contudo, o tempo em que recebeu auxílio-acidente pode ser computado para fins de carência em outros benefícios.
Dicas práticas para o segurado
Se você sofreu um acidente e ficou com sequelas permanentes, não hesite em buscar seus direitos.
O auxílio-acidente é um benefício pensado exatamente para sua situação: trabalhadores que, mesmo com limitações, mantêm capacidade laborativa. Documente adequadamente suas sequelas através de acompanhamento médico regular e mantenha organizados todos os exames e laudos médicos.
Procure orientação profissional quando necessário. Advogados especializados em direito previdenciário podem auxiliar tanto na fase administrativa quanto em eventual necessidade de ação judicial. Muitos profissionais trabalham com honorários de êxito, ou seja, só recebem em caso de sucesso na obtenção do benefício.
Lembre-se: trabalhar não apenas é compatível com o auxílio-acidente como é recomendável. O benefício foi criado justamente para permitir que trabalhadores com sequelas permanentes continuem produtivos e integrados ao mercado de trabalho, recebendo compensação justa pelas limitações adquiridas. É um direito seu garantido por lei, use-o quando necessário.
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